Beth Harmon: Xeque-Mate nas Feridas da Alma (Ou Como Encontrar a Si Mesma em 64 Casas)
- Eloina Santos
- 2 de mar.
- 3 min de leitura
Atualizado: 1 de mai.
Olha, se alguém me dissesse que um dia eu escreveria uma resenha sobre xadrez e Freud, eu riria até cair do tabuleiro. Mas o mundo gira e olha eu aqui falando da Beth Harmon, ela que não é só uma enxadrista genial de vestido plissado, mas também uma caixa de pandora de saltinho e batom vermelho. Então, acredito que valha o espaço nesse humilde divã para desvendar essa rainha do gambito, concorda?

Beth chega ao mundo como um peão em um jogo que não escolheu jogar: órfã, mãe biograficamente complicada (para dizer o mínimo), e uma infância em um orfanato dos anos 50 que parece saído de um manual de “como criar traumas em 7 lições”. Ah, e os tranquilizantes verdes? Querida pessoa que ler minhas resenhas, se Freud visse aquelas pílulas, escreveria um tratado só sobre elas. Não é à toa que Beth transforma o xadrez em seu refúgio, o tabuleiro vira um território controlável, onde cada movimento é uma tentativa desesperada de domar o caos interno. É como se dissesse: “Se minha vida é um terremoto, pelo menos aqui eu decido onde as peças caem”.
Mas calma, Freud não é só trauma. A psicanálise também fala de desejo, repetição e… relações maternas falidas (me deu vontade de gargalhar agora). Beth passa a vida buscando substitutos para a figura materna: a Sra. Wheatley, que mais parece uma boneca de porcelana com vício em compras, e até o próprio xadrez, que funciona como uma mãe simbólica: rigorosa, desafiadora, mas que a faz sentir pertencimento. E os homens? Benny, Townes, Harry… Todos são espelhos onde ela tenta se ver, mas acabam refletindo sua solidão. Freud diria que ela está repetindo padrões edipianos (sim, aquele tão famoso complexo, lembra?), tentando tamponar um vazio que nem o xeque-mate mais brilhante consegue preencher.

Agora, falemos da verdinha(se começou a ouvir um reggue mental, volta, foca aqui). As pílulas são sua muleta psíquica: uma relação tóxica digna de reality show. Elas a conectam à mãe biológica (que morreu dirigindo sob efeito de remédios) e ao primeiro “amor”, o xadrez, já que foi sob o efeito delas que descobriu o jogo. É uma dependência que mistura fuga e poder: quando está dopada, o mundo fica nítido, mas quando tenta largar, vira um tabuleiro de incertezas. Acredito que todo psicanalista adoraria trabalhar essa dualidade: “Ah, a humana contradição de buscar no veneno a cura”.
Mas Beth não é só um quebra-cabeça que desafia — ela é humana, e é aí que a série brilha. Sua jornada é sobre aprender a jogar contra si mesma. Cada derrota, cada escorregão nas pílulas ou nos homens, é um movimento para enxergar que o verdadeiro adversário não está do outro lado do tabuleiro, mas dentro dela. E o final? Ela jogando xadrez sozinha, sorrindo, é a cereja do bolo: ela finalmente entendeu que o prazer não está em vencer, mas em se reconhecer no jogo. E nossa! Como eu amo esse arco de personagem.

Minha humilde opinião: O Gambito da Rainha é como um vinho caro que envelhece bem na memória, com ambientação impecável e figurino que dá vontade de vestir mesmo pra ir ao mercado. Quanto à Beth, magnanimamente interpretada pela Anya Taylor-Joy, ela me faz torcer, ranger os dentes e suspirar igual a uma dorameira raiz. É forte? Sim, mas com uma fragilidade que a torna real. Não concordo quando ela sabota a si mesma, mas entendo: quem nunca usou um “tranquilizante emocional” (seja ele qual for) pra fugir dos próprios demônios?
No fim, Beth Harmon é a prova de que até os maiores gênios carregam cicatrizes, e que, às vezes, a maior vitória é parar de lutar contra o espelho e simplesmente… jogar. Xeque-mate, Sigmund.
🎬CLAQUETE :
Série: O Gambito da Rainha
Título original: The Queen’s Gambit
Criadores: Scott Frank e Allan Scott
Ano de lançamento:2020 (1 temporada com 7 episódios)
Onde assistir: Netflix
Que analise lindíssima e muito competente, minha amiga.